O que é vertigem? Medo de cair? Mas porque temos vertigem num mirante cercado por uma balaustra sólida?
Vertigem não é o medo de cair, é outra coisa.
É a voz do vazio debaixo de nós, que nos atrae e nos envolve, é o desejo da queda do qual nos defendemos aterrorizados.

Milan Kundera

Somente no amor gostamos de ver alguém mais feliz do que nós mesmos...

sábado, 31 de dezembro de 2011

Feliz Ano Novo!

Para você ganhar belíssimo Ano Novo,
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com tôo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
vcoê não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens,
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)

Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta
não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo augusto direito de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente,
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

Receita de Ano Novo - Carlos Drummond de Andrade

Não me convidem a ser igual...

Gosto dos venenos os mais lentos, das bebidas as mais amargas, dos cafés os mais fortes, das drogas as mais poderosas, das idéias as mais insanas, dos pensamentos os mais complexos, dos sentimentos os mais fortes... tenho um apetite voraz e os delírios mais loucos!
Você pode até me empurrar de um penhasco que eu vou dizer: - E daí? Eu adoro voar!
Não me dêem fórmulas certas, por que eu não espero acertar sempre. Não me mostrem o que esperam de mim, por que vou seguir meu coração. Não me façam ser quem não sou. Não me convidem a ser igual, por que sinceramente sou diferente. Não sei amar pela metade. Não sei viver de mentira. Não sei voar de pés no chão. Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma para sempre.


Clarice Lispector

A Rua dos Cataventos


Da vez primeira em que me assassinaram,
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.
Depois, a cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha.

Hoje, dos meus cadáveres eu sou
O mais desnudo, o que não tem mais nada.
Arde um toco de vela amarelada,
Como único bem que me ficou.

Vinde! Corvos, chacais, ladrões de estrada!
Pois dessa mão avaramente adunca
Não haverão de arrancar a luz sagrada!

Aves da noite! Asas do horror! Voejai!
Que a luz trêmula e triste como um ai,
A luz de um morto não se apaga nunca!

Mário Quintana

... então me vens!


Então me vens e me chega e me invades e me tomas e me pedes e me perdes e te derramas sobre mim com teus olhos sempre fugitivos e abres a boca para libertar novas histórias e outra vez me completo assim, sem urgências, e me concentro inteiro nas coisas que me contas, e assim calado, e assim submisso, te mastigo dentro de mim enquanto me apunhalas com lenta delicadeza deixando claro em cada promessa que jamais será cumprida, que nada devo esperar além dessa máscara colorida, que me queres assim porque assim que és...

Caio Fernando Abreu

O Racionais fez uma música pro Ronaldo Fenômeno ... é o fim do mundo mesmo!

COM TANTA COISA PRO RACIONAIS FAZER MÚSICA!!!! DENUNCIAR...


A fome provém da falta de alimentos que atinge um número elevado de pessoas no Brasil e no mundo. Apesar dos grandes avanços econômicos, sociais, tecnológicos, a falta de comida para milhares de pessoas no Brasil continua. Esse processo é resultado da desigualdade de renda, a falta de dinheiro faz com que cerca de 32 milhões de pessoas passem fome, mais 65 milhões de pessoas que não ingerem a quantidade mínima diária de calorias, ou seja, se alimentam de forma precária. 
Número extremamente elevado, tendo em vista a extensão territorial do país que apresenta grande potencial agrícola. Mas isso é irrelevante, uma vez que existe uma concentração fundiária e de renda. Grande parte do dinheiro do país está nas mãos de somente 10% da população brasileira. 
O difícil é entender um país onde os recordes de produção agrícola se modificam de maneira crescente no decorrer dos anos, enquanto a fome faz parte do convívio de um número alarmante de pessoas. A monocultura tem como objetivo a exportação, pois grande parcela da produção é destinada à nutrição animal em países desenvolvidos. 
Mesmo com programas sociais federais e estaduais o problema da fome não é solucionado, o pior é que ela se faz presente em pequenas, médias e grandes cidades e também no campo, independentemente da região ou estado brasileiro. 
A solução para a questão parece distante, envolve uma série de fatores estruturais que estão impregnados na sociedade brasileira. Fornecer cestas básicas não resolve o problema, apenas adia o mesmo, é preciso oferecer condições para que o cidadão tenha possibilidade de se auto-sustentar por meio de um trabalho e uma remuneração digna.


Por Eduardo de Freitas
Graduado em Geografia
Equipe Brasil Escola

CONFIRA O CLIPE NA ÍNTEGRA DA MÚSICA QUE OS RACIONAIS MC's FIZERAM PARA RONALDO FENÔMENO

http://tvg.globo.com/caldeirao-do-huck/O-Programa/noticia/2011/12/huck-homenageia-ronaldo-fenomeno-com-clipe-dos-racionais-mcs.html

Os Honoráveis Bandidos e o Holocausto Brasileiro

http://carosamigos.terra.com.br/index2/index.php/artigos-e-debates/2246-os-honoraveis-bandidos-e-o-holocausto-brasileiro

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Ana Cristina César


Tarde aprendi
bom mesmo
é dar a alma como lavada.
Não há razão
para conservar
este fiapo de noite velha.
Que significa isso?
Há uma fita
que vai sendo cortada
deixando uma sombra
no papel.
Discursos detonam.
Não sou eu que estou ali
de roupa escura
sorrindo ou fingindo
ouvir.
No entanto
também escrevi coisas assim,
para pessoas que nem sei mais
quem são,
de uma doçura
venenosa
de tão funda.

... uma música que renova!

... mas duas medalhas sim!

Fim (Quando eu morrer)

Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas

Que meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro.

Mario de Sá Carneiro  

Vinícius de Moraes


A maior solidão é a do ser que não ama. A maior solidão é a do ser que se ausenta, que se defende, que se fecha, que se recusa a participar da vida humana. A maior solidão é a do homem encerrado em si mesmo, no absoluto de si mesmo, o que não dá a quem pede o que ele pode dar de amor, de amizade, de socorro. O maior solitário é o que tem medo de amar, o que tem medo de ferir e ferir-se, o ser casto da mulher, do amigo, do povo, do mundo. Esse queima como uma lâmpada triste, cujo reflexo entristece também tudo em torno. Ele é a angústia do mundo que o reflete. Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes de emoção, as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilégio, semeia pedras do alto de sua fria e desolada torre.



Mitologia




Ninguém gosta de receber más notícias, ser contrariado ou ter suas expectativas desfeitas, nem mesmo os deuses. Apolo, o deus dos oráculos, devia saber o quanto a verdade podia doer. Ele amava Corones, uma jovem princesa de Tessália, mas ela gostava de outro, um simples mortal com quem se encontrava às escondidas. Desconfiado, Apolo mandou o corvo, um de seus auxiliares alados, vigiar de perto a faceira princesinha. Pobre corvo. Quando veio relatar os encontros furtivos de Corones, Apolo ficou furioso e resolveu castigá-lo, mudando a cor de suas asas brancas como a neve, para a cor preta que os corvos tem até hoje.

Muitos reis e tiranos do passado agiram como Apolo, punindo o mensageiro por causa do teor da mensagem. Durante a campanha do comandante romano Lúculo contra alguns reinos da Ásia, quando sua legião entrou na Armênia os postos avançados mandaram avisar ao rei local que as forças romanas se aproximavam. O rei Tigranes ficou tão enfurecido que mandou decapitar o mensageiro, por isso ninguém ousou contar-lhe coisa alguma. Enquanto os romanos apertavam o cerco, Tigranes continuava inerte sem ter a menor idéia do que estava acontecendo, ouvindo apenas a voz de seus bajuladores que lhe diziam que Lúculo já devia estar voltando para Roma. Porém um amigo favorito do rei tomou coragem para anunciar-lhe que a derrota era iminente, como de fato aconteceu. 

Outro foi Côtis, rei da Trácia, dissoluto e beberrão que decidiu que haveria de passar uma noite de amor com a deusa Atena, uma das deusas virgens do Olimpo. Para uma ocasião tão importante, preparou um banquete numa mesa luxuosíssima numa alcova ricamente decorada, dispondo uma cama com lençóis e travesseiros dignos da ilustre convidada. Depois de tudo preparado, Côtis se pôs a beber vinho aguardando a chegada de Atena. Como o tempo passasse e a deusa não aparecia, mandou um guarda verificar se ela não tinha se perdido nos corredores do palácio. Quando o guarda retornou dizendo que não havia ninguém, o rei o matou. Mais tempo se passou e Côtis mandou um segundo guarda. O guarda também disse que não havia ninguém, e morreu também. Quando Côtis mandou o terceiro guarda, apavorado com o que acontecera com seus colegas, ele voltou dizendo que a deusa estava chegando ao palácio, pois sofrera um pequeno atraso e depois fugiu.


Poesia




Morte, não te orgulhes, embora alguns te provem
Poderosa, temível, pois não és assim.
Pobre morte: não poderás matar-me à mim,
E os que presumes que derrubaste, não morrem
Se tuas imagens, sono e repouso, nos podem
Dar prazer, quem sabe mais nos darás? Enfim,
Descansar corpos, liberar almas, é ruim?
Por isso cedo, os melhores homens te escolhem.
És escrava do fado, de reis, do suicida;
Com guerras, veneno, doença hás de conviver;
Ópios e mágicas também têm teu poder
De fazer dormir. E te inflas envaidecida?
Após curto sono, acorda eterno o que jaz,
E a morte já não é; morte, tu morrerás.

Jonh Donne


Do filme: Uma Carta de Amor

Minha querida Catherine

Sinto a tua falta, meu amor, como sempre, mas hoje é particularmente difícil porque o oceano tem estado a cantar para mim, e a canção é a da nossa vida juntos. Quase consigo sentir-te a meu lado enquanto escrevo esta carta, e consigo cheirar o aroma de flores silvestres que me faz sempre lembrar de ti. 
Mas neste momento, essas coisas não me dão qualquer prazer.
As tuas visitas têm sido menos freqüentes, e por vezes sinto como se a maior parte do que sou estivesse lentamente a dissipar-se. Estou a tentar, ainda assim. À noite quando estou sozinho, chamo por ti, e sempre que a minha dor parece se maior, encontras constantemente maneira de voltar pra mim. Ontem à noite, nos meu sonhos, vi-te no portão perto de Wrightsville Beach.
O vento soprava através do teu cabelo e os teus olhos retinha, a luz pálida do sol que se desvanecia. Fico espantado quando te vejo encostada ao parapeito. Tu és bela, penso, enquanto te vejo, uma visão que nunca consigo encontrar em mais ninguém. Começo a andar lentamente na tua direção e quando, finalmente, te voltas para mim, reparo que outros têm estado a observar-te também e perguntam-me em sussurros invejosos, "conhece ela?" e enquanto sorris para mim, respondo simplesmente com a verdade: "melhor do que meu próprio coração"
Paro quando chego perto de ti e envolvo-te nos meu braços. Anseio por esse momento mais do que qualquer outro. É a razão da minha vida, e quando tu retribuis o meu abraço, eu entrego-me a esse momento, em paz mais uma vez.
Levanto a mão e toco suavemente na tua face e tu inclinas a cabeça e fecha os olhos. As minhas mãos são ásperas e a tua pele é macia, e interrogo-me durante um momento se vais afastar-te, mas claro que não o fazes. Nunca o fizeste, e é em alturas como esta, que eu sei, qual é o meu objetivo na vida. Estou aqui para amar, para te segurar nos meu braços, para te proteger.
Estou aqui para aprender contigo e para receber o teu amor em troca. Estou aqui porque não existe outro sítio onde possa estar, mas depois, como sempre, a neblina começa a formar-se enquanto permanecemos juntos um do outro. É um nevoeiro distante que nasce do horizonte, e descubro que começo a ficar com medo à medida que ele se aproxima. Ele insinua-se lentamente, envolvendo o mundo à nossa volta, cercando-nos como que para evitar que fujamos. Como uma nuvem rolante, cobre tudo, fechando, ate mais nada restar senão nós os dois. Sinto a minha garganta a começar a fechar e os meus olhos a encherem-se de lágrimas porque sei que são horas de partires. O olhar que lanças naquele momento persegue-me. Sinto a tua tristeza e a minha própria solidão, e a dor no meu coração, que permanecera silenciosa só por um pequeno intervalo de tempo, torna-se mais forte quando tu me soltas. E então estendes os braços e dás uns passos p/ trás, desaparecendo no nevoeiro porque ele é o teu lugar e não o meu. Anseio por ir contigo, mas a tua única resposta é abanares a cabeça porque ambos sabemos que é impossível. E eu assisto com o coração a partir-se enquanto desapareces lentamente.
Dou comigo a esforçar-me por lembrar tudo acerca daquele momento, tudo acerca de ti. Mas depressa, sempre demasiado depressa, a tua imagem desaparece e o nevoeiro recua para o seu lugar longínquo e eu fico sozinho no pontão e não me importo com que os outros pensam quando baixo a cabeça e choro, choro e choro.

Garrett... 
22 de julho de 1997


A emergência dos dias nos fazem criar uma redoma em volta do nosso sentir. Sou sempre tão intensa em tudo que vivo, sempre fui e vou continuar sendo assim, porque é tão fácil passar pela vida sem paixão, sem culpa, sem dor, com uma alegria comprada e falsa, e como já escrevi aqui antes é na tristeza que nos humanizamos, e com isso nos tornamos melhores, pois explode dentro de nós uma noção exata de quando ter orgulho foi desnecessário e de quando ter orgulho foi proteção. Ninguém admite, porque admitir a própria vulnerabilidade é admitir humanidade, e não queremos ser humanos mas deuses. Deuses mortais, perversos, vazios e inúteis mas deuses! 
É por isso que gosto tanto de ler Nietzsche, ele nos diz que não somos fortes mas sim orgulhosos, e donos de um orgulho corrompido e degenerado que nos afasta das alegrias simples do existir.

Na tristeza mesmo que no nosso silêncio relembramos os momentos procurando saber onde mais erramos, repetimos na cabeça as palavras, ditas e não ditas, procurando os erros do caminho, e a vida fica amarrada, mas só quando a gente sofre, perde, e pra mim isso é sinônimo de liberdade ... ser humana, estar humana, apesar do meu orgulho também ser venenoso, me sentir humana, sucumbir e não ser só mais uma pessoa que suporta tudo ou que não sente nada igual a todo mundo.

Gosto de sentir as coisas, qualquer coisa, pessoa, fato, ação da vida, do que uns chamam Deus e outros Ciência, não importa, me comovo com as coisas que todo mundo acha serem banais, cotidianas ou comuns como o sol se pondo, o desenho das nuvens no céu ... quando estou em paz e quieta olho pro céu fico procurando formas nas nuvens, procurando desenhos ... adoro o cair da tarde, o inicio da noite e o amanhecer ... amo tanto a vida que sinto um profundo medo de nunca até hoje ter conseguido compreender a razão dela e toda a emergência que vejo nos olhos das pessoas ... a emergência de vencer, de subir, de nunca se satisfazer com nada!


terça-feira, 27 de dezembro de 2011

...LINDO!

Breve Testemunho

"Primeiro vieram buscar os judeus e eu não me incomodei porque não era judeu. Depois levaram os comunistas e eu também não me importei,pois não era comunista. Levaram os liberais e também encolhi os ombros. Nunca fui liberal. Em seguida os católicos, eu era protestante. Quando me vieram buscar já não havia ninguém para me defender...”


Martin Niemöller (1892-1984), sobre sua vida na Alemanha Nazista.

Apostila (1928)

Aproveitar o tempo! 
Mas o que é o tempo, que eu o aproveite? 
Aproveitar o tempo! 
Nenhum dia sem linha... 
O trabalho honesto e superior... 
O trabalho à Virgílio, à Mílton... 
Mas é tão difícil ser honesto ou superior! 
É tão pouco provável ser Milton ou ser Virgílio!
Aproveitar o tempo! 
Tirar da alma os bocados precisos - nem mais nem menos - 
Para com eles juntar os cubos ajustados 
Que fazem gravuras certas na história 
(E estão certas também do lado de baixo que se não vê)... 
Pôr as sensações em castelo de cartas, pobre China dos serões, 
E os pensamentos em dominó, igual contra igual, 
E a vontade em carambola difícil.
Imagens de jogos ou de paciências ou de passatempos - 
Imagens da vida, imagens das vidas. Imagens da Vida.
Verbalismo...
Sim, verbalismo...
Aproveitar o tempo!
Não ter um minuto que o exame de consciência desconheça...
Não ter um acto indefinido nem factício...
Não ter um movimento desconforme com propósitos...
Boas maneiras da alma...
Elegância de persistir...
Aproveitar o tempo! 
Meu coração está cansado como mendigo verdadeiro. 
Meu cérebro está pronto como um fardo posto ao canto. 
Meu canto (verbalismo!) está tal como está e é triste. 
Aproveitar o tempo! 
Desde que comecei a escrever passaram cinco minutos. 
Aproveitei-os ou não? 
Se não sei se os aproveitei, que saberei de outros minutos?!
(Passageira que viajas tantas vezes no mesmo compartimento comigo 
No comboio suburbano, 
Chegaste a interessar-te por mim? 
Aproveitei o tempo olhando para ti?
Qual foi o ritmo do nosso sossego no comboio andante?
Qual foi o entendimento que não chegámos a ter? 
Qual foi a vida que houve nisto?
Que foi isto a vida?)
 
Aproveitar o tempo! 
Ah, deixem-me não aproveitar nada! 
Nem tempo, nem ser, nem memórias de tempo ou de ser!... 
Deixem-me ser uma folha de árvore, titilada por brisa, 
A poeira de uma estrada involuntária e sozinha, 
O vinco deixado na estrada pelas rodas enquanto não vêm outras, 
O pião do garoto, que vai a parar, 
E estremece, no mesmo movimento que o da terra, 
E oscila, no mesmo movimento que o da alma, 
E cai, como caem os deuses, no chão do Destino.

Álvaro de Campos

Você que zomba dos outros ...

AULA DE DESENHO

Estou lá onde me invento e me faço:
De giz é meu traço. De aço, o papel.
Esboço uma face a régua e compasso:
É falsa. Desfaço o que fiz.
Retraço o retrato. Evoco o abstrato
Faço da sombra minha raiz.
Farta de mim, afasto-me
e constato: na arte ou na vida,
em carne, osso, lápis ou giz
onde estou não é sempre
e o que sou é por um triz.


Maria Esther Maciel

CANÇÃO DE OUTONO

Estes lamentos
Dos violões lentos
Do outono
Enchem minha alma
De uma onda calma
De sono.

E soluçando,
Pálido, quando
Soa a hora,
Recordo todos
Os dias doidos
De outrora.

E vou à toa
No ar mau que voa.
Que importa?
Vou pela vida,
Folha caída
E morta.


CANÇÃO DE OUTONO - Paul Verlaine
Tradução: Guilherme de Almeida

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Já escolhi meu sapato...

Eu sou a luz que se apaga....

Elis ...

... crianças

http://www.estadao.com.br/noticias/geral,criancas-faturam-ate-r-2-mil-em-farois-e-feiras-de-sp,476080,0.htm

A infância não pode esperar

http://fundacaoabrinq.wordpress.com/2010/06/30/criancas-trabalham-durante-jogo-do-brasil/

Quero assistir

O Jardineiro Fiel

Feliz Natal ...

Me leve apenas para andar por aí



O meu coração, meu coração
Meu coração parece que perde um pedaço, mas não
Me leve a sério
Passou este verão
Outros passarão
Eu passo

Chico Buarque

A felicidade
Morava tão vizinha
Que, de tolo
Até pensei que fosse minha

Caio Fernando Abreu

Porque aprendi, que a vida, apesar de bruta, é meio mágica. Dá sempre pra tirar um coelho da cartola.
Porque a vida segue. Mas o que foi bonito fica com toda a força. Mesmo que a gente tente apagar com outras coisas bonitas ou leves, certos momentos nem o tempo apaga. E a gente lembra. E já não dói mais. Mas dá saudade. Uma saudade que faz os olhos brilharem por alguns segundos e um sorriso escapar volta e meia, quando a cabeça insiste em trazer a tona, o que o coração precisa deixar pra trás.

Tive um sonho... estranho

Não comemoro o Natal! Raramente compro ou troco presentes, e minha ceia sempre é simples, quero dizer sem exageros, pois não consigo ver sentido em uma felicidade refletida em tanta tristeza espalhada pelas ruas! Respondo às mensagens dos amigos e da família, mas não lembro de algum dia ter escrito algum cartão e nunca comprei ou enfeitei uma árvore.
Não comemoro o Natal como as pessoas normais comemoram, e juro que não é nenhum rancor que tenho da vida, só que vejo este dia como um dia em que minha consciência fica mais aguda porque por onde olho vejo luz e festa em contraste com a sombra e a inconsciência dos que não tem como ou porque festejar, e que no meia-noite estarão em algum lugar dentro deste "espiríto" natalino invisível igual ao de todos que não compartilham seu frio, fome, vício, botas e roupas furadas ou invisibilidade!
Perguntaram este ano, pra um garoto morador de rua de menos de 13 anos, num destes programas que denunciam esta podridão toda que há no mundo, e que persiste à sombra dos impotentes como eu, e à luz natalina dos degenerados que só pensam no próprio peru de natal, porque ele cheirava cola, e ele respondeu que era "pra esquecer a fome"...
Bom, este ano eu fui deitar mais cedo comparando com o horário que normalmente durmo...
Apesar de sempre me lembrar que o Natal é a data do nascimento de Jesus, e ficar bem por isso pois considero a história dele um exemplo de renúncia à ser seguido em prol do próximo, todo ano fico mais quieta neste dia, e estava este ano também menos afeita a abraços do que no ano passado... talvez por minha tristeza, ou cansaço pela vida, porque como diz a personagem do escritor Górki, Tatiana em Pequenos Burgueses, "a vida cansa", deitei mais cedo e tive um sonho manso que valeu a noite de Natal...
Não lembro onde estava, nem com quem estava, lembro que estava estranhamente calada, que sentia uma raiva profunda e angustiante que até nem queria sentir, mas que meu orgulho me exigia solenemente sentir, e que não abaixei a cabeça ao cruzar um corredor qualquer entre umas salas, e que olhei em frente mesmo sentindo que no lugar tinha muitas pessoas que olhavam pra mim e que de repente, senti uma mão na minha cintura e uma voz que disse: venha, vamos comer alguma coisa! Está tudo bem!
Sai, com esta pessoa do lugar em que estávamos e que parecia ser uma casa velha pelo cheiro de mofo, e apesar de estar mesmo com fome não comi nada, mas não me importei, estava mais preocupada no próprio sonho em reconhecer a tal pessoa que estava comigo e que tinha voz familiar!
Lembro vagamente do sonho que me deixou uma sensação de paz! Sei que fiquei calada, e que a tal pessoa que não me lembro ainda de ter reconhecido nem no sonho e nem ao acordar, também não falou nada e só ficou do meu lado!  
Não me lembro de ter ouvido nada que pudesse me confortar de alguma forma ou diminuir minha raiva, mas acordei mais ou menos às quatro da manhã, sentei na cama e percebi que estava mais serena do que quando fui me deitar e com uma certeza de que estava amparada!
Pensei que talvez sendo eu, uma pessoa que acredita muito nos sonhos, até mesmo por minha inclinação religiosa, que talvez nesta noite, eu tenha estado ao lado do que nós cristãos convencionamos chamar por anjo! Um anjo que veio até mim para aliviar meu pesar pela vida, minha angústia!
Foi quase um Natal cristão, pois senti que alguém tinha vindo pra me resgatar da minha raiva, e me senti muito bem por não estar sozinha!

... como um jogo!

“Lá está ela, mais uma vez. Não sei, não vou saber, não dá pra entender como ela não se cansa disso. Sabe que tudo acontece como um jogo, se é de azar ou de sorte, não dá pra prever. Ou melhor, até se pode prever, mas ela dispensa.
Acredito que essa moça, no fundo gosta dessas coisas. De se apaixonar, de se jogar num rio onde ela não sabe se consegue nadar. Ela não desiste e leva bóias. E se ela se afogar, se recupera.
Estranho e que ela já apanhou demais da vida. Essa moça tem relacionamentos estranhos, acho que ela está condicionada a ser uma pessoa substituta. E quem não é?
A gente sempre acha que é especial na vida de alguém, mas o que te garante que você não está somente servindo pra tapar buracos, servindo de curativo pras feridas antigas?
A moça…ela muito amou, ama, amará, e muito se machuca também. Porque amar também é isso, não? Dar o seu melhor pra curar outra pessoa de todos os golpes, até que ela fique bem e te deixe pra trás, fraco e sangrando. Daí você espera por alguém que venha te curar.
Às vezes esse alguém aparece, outras vezes, não. E pra ela? Por quem ela espera?
E assim, aos poucos, ela se esquece dos socos, pontapés, golpes baixos que a vida lhe deu, lhe dará.
A moça – que não era Capitu, mas também têm olhos de ressaca – levanta e segue em frente.
Não por ser forte, e sim pelo contrário… Por saber que é fraca o bastante para não conseguir ter ódio no seu coração, na sua alma, na sua essência. E ama, sabendo que vai chorar muitas vezes ainda. Afinal, foi chorando que ela, você e todos os outros, vieram ao mundo.”



Caio Fernando Abreu

domingo, 25 de dezembro de 2011

Silvio Caccia Bava: A renda do brasileiro - Le Monde Diplomatique Brasil

Silvio Caccia Bava: A renda do brasileiro - Le Monde Diplomatique Brasil

PUC ao Vivo: O Desafio da Desigualdade - Setembro de 2007

A desigualdade é de longe o grande problema do país, herança do passado mas também impacto indireto das políticas atuais que a reproduzem. Neste primeiro vídeo (de um conjunto de 6), o professor Ladislau Dowbor analisa os dados básicos da desigualdade, confrontando dados estatísticos com as formas curiosas da sua apresentação na imprensa.

http://video.google.com/videoplay?docid=-809724830496934908#

A sociedade do consumo e a vida do espírito.

A sociedade do consumo e a vida do espírito.

Tecendo a Manhã

Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

______________________João Cabral de Melo Neto

MADALENA

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Quando meu rosto contemplo

Quando meu rosto contemplo,
o espelho se despedaça
por ver como passa o tempo
e o meu desgosto não passa.

Amargo campo da vida,
quem te semeou com dureza,
que os que não se matam de ira
morrem de pureza tristeza?

Cecília Meireles
In: Canções (1956)

... no emaranhado desses seus cabelos

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Somente estou só quando me faltam palavras...

O Leitor (2009) Trailer Legendado Oficial

A Um Ausente

Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.

Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste

(Poema de Carlos Drummond de Andrade pra um Amigo ausente)

Grandes - Álvaro de Campos

 
 Grandes são os desertos, e tudo é deserto. 
 Não são algumas toneladas de pedras ou tijolos ao alto 
 Que disfarçam o solo, o tal solo que é tudo. 
 Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes 
 Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas, 
 Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu. 
 Grandes são os desertos, minha alma! 
 Grandes são os desertos. 

 Não tirei bilhete para a vida, 
 Errei a porta do sentimento, 
 Não houve vontade ou ocasião que eu não perdesse. 
 Hoje não me resta, em vésperas de viagem, 
 Com a mala aberta esperando a arrumação adiada, 
 Sentado na cadeira em companhia com as camisas que não cabem, 
 Hoje não me resta (à parte o incômodo de estar assim sentado) 
 Senão saber isto: 
 Grandes são os desertos, e tudo é deserto. 
 Grande é a vida, e não vale a pena haver vida, 

 Arrumo melhor a mala com os olhos de pensar em arrumar 
 Que com arrumação das mãos factícias (e creio que digo bem) 
 Acendo o cigarro para adiar a viagem, 
 Para adiar todas as viagens. 
 Para adiar o universo inteiro. 

 Volta amanhã, realidade! 
 Basta por hoje, gentes! 
 Adia-te, presente absoluto! 
 Mais vale não ser que ser assim. 

 Comprem chocolates à criança a quem sucedi por erro, 
 E tirem a tabuleta porque amanhã é infinito. 

 Mas tenho que arrumar mala, 
 Tenho por força que arrumar a mala, 
 A mala. 

 Não posso levar as camisas na hipótese e a mala na razão. 
 Sim, toda a vida tenho tido que arrumar a mala. 
 Mas também, toda a vida, tenho ficado sentado sobre o canto das camisas empilhadas, 
 A ruminar, como um boi que não chegou a Ápis, destino. 

 Tenho que arrumar a mala de ser. 
 Tenho que existir a arrumar malas. 
 A cinza do cigarro cai sobre a camisa de cima do monte. 
 Olho para o lado, verifico que estou a dormir. 
 Sei só que tenho que arrumar a mala, 
 E que os desertos são grandes e tudo é deserto, 
 E qualquer parábola a respeito disto, mas dessa é que já me esqueci. 

 Ergo-me de repente todos os Césares.   
 Vou definitivamente arrumar a mala.   
 Arre, hei de arrumá-la e fechá-la;  
 Hei de vê-la levar de aqui, 
 Hei de existir independentemente dela. 

 Grandes são os desertos e tudo é deserto, 
 Salvo erro, naturalmente. 
 Pobre da alma humana com oásis só no deserto ao lado! 

 Mais vale arrumar a mala.

Espelho - Mário Quintana

Por acaso, surpreendo-me no espelho:
Quem é esse que me olha e é tão mais velho que eu? (...)
Parece meu velho pai - que já morreu! (...)
Nosso olhar duro interroga:
"O que fizeste de mim?" Eu pai? Tu é que me invadiste.
Lentamente, ruga a ruga... Que importa!
Eu sou ainda aquele mesmo menino teimoso de sempre
E os teus planos enfim lá se foram por terra,
Mas sei que vi, um dia - a longa, a inútil guerra!
Vi sorrir nesses cansados olhos um orgulho triste..."

Maria Bethânia - Tua (vídeo oficial do dvd) 2010

Relembrando às vezes, mas em frente!

... em alguns poucos sentidos me sinto renovada! Perceber, aceitar certas coisas, exigem maturidade (acho que nunca serei uma pessoa madura ... rsss) mas vou tentar com mais vontade. Ou com uma dose maior de clareza e de entendimento do que não posso mudar!
Não sou má, mas sou exagerada. E muitas vezes desnecessária.
É terrível, tenham certeza porque quando vejo, quando bate a lucidez, já foi!
... já falei, já fiz e ai o que me sobra sempre é mais uma noite sem sono, ou repleta de arrependimento. Passo cinco, dez dias, no mais absoluto conflito interno, pois não posso mudar o que aconteceu, e nessa hora apelo pro que existe de sagrado no universo, um sagrado sem nome que ta mais em mim, ou que mais satisfaz o meu ego (um ego muito fdp) do que o resto do mundo.
Sou uma pessoa estranha. Penso, sinto, sofro, porque acredito demais em alianças, e me perco por isso, perco meu sono e paz, pois enalteço algumas ações sem contar que elas são reflexo do momento, e que estão sujeitas à mudanças, e não se manterão além do que importa naquela hora.
Quando algo me fere, e como sou tola e ingenua muita coisa me fere, choro como criança, passo pela fase do "porque" como todo mundo, sinto raiva mas depois passa porque a alma, o coração vai acalmando, absorvo, penso, repenso, mastigo e engulo o acontecido, e sigo em frente.
No começo com dificuldade, mas sigo, cambaleando, relembrando as vezes, mas sigo. É a vida, e devemos, eu devo, aprender a aceitar ela assim, néh? ... não vou mudar nada mesmo!
Na verdade, e nunca quiz admitir esta possibilidade antes, acho que fazer terapia seria uma boa idéia ... sei lá, talvez eu deva entender que preciso mesmo crescer, e os psicólogos são tão bons em nos transformar em adultos. Eu sempre quiz ser o Peter Pan, acho que ainda é o meu conto favorito porque queria pra sempre, eternamente, ver o mundo, a vida, as pessoas com a ingenuidade de uma criança!
Não me encaixo no mundo dos adultos, porque no fundo, ou no fim de tudo o que quebrou não tem conserto, e as crianças acreditam que existe uma fábrica mágica, invisível no mundo (alguns chamam ela de Deus) capaz de consertar qualquer coisa.

E essa mágica não existe! ...

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Os homens sábios entendem o que vai passar-se


O que acontece agora sabem os mortais,
e o que será um dia os deuses sabem,
os únicos senhores de toda a luz profunda.
Mas o que vai acontecer em breve
o atento sábio sabe.
O seu ouvido às horas do silêncio há que escuta
inquieto e perturbado estranhos sons
que às vezes vêm de eventos que estão prestes.
E respeitosamente atenta neles,
enquanto as gentes fora nada ouvem.

[1915]

Constantino Cavafy
(tradução de Jorge de Sena)
Porque os deuses sabem dos eventos futuros, e os
homens dos eventos presentes. Mas o sábio sabe do
que vai passar-se.
Filóstrato, Sobre Apolónio de Tiana, VII 7.

O Senhor Diabo - Eça de Queiróz

Conhecem o Diabo?

Não serei eu quem lhes conte a vida dele. E, todavia, sei de cor a sua legenda trágica, luminosa, celeste, grotesca e suave!

O Diabo é a figura mais dramática da História da Alma. A sua vida é a grande aventura do Mal. Foi ele que inventou os enfeites que enlanguescem a alma, e as armas que ensangüentam o corpo. E todavia, em certos momentos da história, o Diabo é o representante imenso do direito humano. Quer a liberdade, a fecundidade, a força, a lei. É então uma espécie de Pã sinistro, onde rugem as fundas rebeliões da Natureza. Combate o sacerdócio e a virgindade; aconselha a Cristo que viva, e aos místicos que entrem na humanidade.

É incompreensível: tortura os santos e defende a Igreja. No século 16 é o maior zelador da colheita dos dízimos.

É envenenador e estrangulador. É impostor, tirano, vaidoso e traidor. Todavia, conspira contra os imperadores da Alemanha; consulta Aristóteles e Santo Agostinho, e suplicia Judas que vendeu Cristo e Bruto que apunhalou César.

O Diabo ao mesmo tempo tem uma tristeza imensa e doce. Tem talvez nostalgia do Céu!

Ainda novo, quando os astros lhe chamavam Lúcifer, o que leva a luz, revolta-se contra Jeová e comanda uma grande batalha entre as nuvens.
Depois tenta Eva, engana o profeta Daniel, apupa Jó, tortura Sara e em Babilônia é jogador, palhaço, difamador, libertino e carrasco. Quando os deuses foram exilados, ele acampa com eles nas florestas úmidas da Gália e embarca expedições olímpicas nos navios do imperador Constâncio. Cheio de medo diante dos olhos tristes de Jesus, vem torturar os monges do Ocidente. 

Para explicar o amor Chico cita Montaigne

Memória (declamado por Carlos Drummond de Andrade)

domingo, 13 de novembro de 2011

Meow (Marcos Magalhães, 1981)

VOZES DE UM TÚMULO

Morri! E a Terra - a mãe comum - o brilho
Destes meus olhos apagou!... Assim
Tântalo, aos reais convivas, num festim,
Serviu as carnes do seu próprio filho!

Por que para este cemitério vim?!
Por quê?! Antes da vida o angusto trilho
Palmilhasse, do que este que palmilho
E que me assombra, porque não tem fim!

No ardor do sonho que o fronema exalta
Construí de orgulho ênea pirâmide alta...
Hoje, porém, que se desmoronou

A pirâmide real do meu orgulho,
Hoje que apenas sou matéria e entulho
Tenho consciência de que nada sou!

Sob um leve desespero ...

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

... onde eu estava?

... e nunca nada lhe perguntei.
Mas algo remoe aqui dentro de mim,
preciso saber, se é verdade o que vieram me falar...

Mas que direito eu teria de perguntar?

... hoje. sinto solidão pela minha ingenuidade!
Como pôde como uma onda,
Um olhar tragar minha alma?

Onde eu estava?
Nunca imaginei que estivesse tão perdido...
Que um abismo pudesse ser tentador,
E não apenas, e coerentemente mortal!

Acabo de acordar.
Sinto a cabeça rodando,
... e a boca amarga!

Não sou mais do que um quadro,
... em branco!
Não sou mais do que uma saudade triste e vazia!

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

A menina que calou o mundo em 5 minutos

XI CANTO DO POEMA - PABLO NERUDA

Tenho fome de tua boca, de tua voz, de teu pêlo
e por estas ruas me vou sem alimento, calado,
não me nutri o pão, a aurora me altera,
busco o som líquido de teus pés neste dia.
Estou faminto de teu riso resvalado,
de tuas mãos cor de furioso silo,
tenho fome da pálida pedra de tuas unhas,
quero comer teu pé como uma intacta amêndoa.
Quero comer o raio queimado em tua formosura,
o nariz soberano do arrogante rosto,
quero comer a sombra fugaz de tuas sobrancelhas.
e faminto venho e vou olfateando o crepúsculo
buscando-te, buscando teu coração quente
como uma puma na solidão de Quitratúe.

O Bandolim - Augusto dos Anjos

Cantas, soluças, bandolim do Fado
E de Saudade o peito meu transbordas;
Choras, e eu julgo que nas tuas cordas
Choram todas as cordas do Passado!
Guardas a alma talvez d'um desgraçado,
Um dia morto da Ilusão às bordas, 
Tanto que cantas, e ilusões acordas,
Tanto que gemes, bandolim do Fado.
Quando alta noite, a lua é triste e calma,
Teu canto, vindo de profundas fráguas,
É como as nênias do Coveiro d'alma!
Tudo eterizas num coral de endechas...
E vais aos poucos soluçando mágoas,
E vais aos poucos soluçando queixas!

Anseios - Florbela Espanca

Meu doido coração aonde vais,
No teu imenso anseio de liberdade?
Toma cautela com a realidade;
Meu pobre coração olha cais!
Deixa-te estar quietinho! Não amais
A doce quietação da soledade?
Tuas lindas quimeras irreais
Não valem o prazer duma saudade!
Tu chamas ao meu seio, negra prisão!...
Ai, vê lá bem, ó doido coração,
Não te deslumbre o brilho do luar!
Não ‘stendas tuas asas para o longe...
Deixa-te estar quietinho, triste monge,
Na paz da tua cela, a soluçar!...

Eu creio na alma ...

Eu creio na alma
Nau feita para as grandes travessias
Que vaga em qualquer mar e habita em qualquer porto
Eu creio na alma imensa
A alma dos grandes mistérios
A grande alma que em vão busquei sufocar
Eu creio na alma eterna
A alma boa, a alma pura, a alma singela
A alma que possui o espaço
A alma que não possui o tempo
A grande alma sozinha
Capaz de conter toda a humanidade
Senhor! Eu creio nela
Eu creio na minha alma extraordinária
Ela era como o templo
Onde os vendilhões mercadejavam
Ela expulsou os vendilhões, Senhor!
E os pássaros cantaram.
Eu creio na alma grande
Em busca dum élan que a lance sempre
Para o eterno movimento
A alma espelho das águas
Onde o céu reflete os pássaros que voam
Eu creio em ti, Senhor
Porque és a alma que é o céu onde os pássaros voam
E que se reflete no espelho das águas
Porque és a grande alma que paira
Eu creio em mim, Senhor
Porque sou alma feita à tua semelhante
Grande alma onipotente
Que no começo era o nada
O nada – vazio das almas
O nada cheio de treva e maldição
Mas o espírito erguia-se do caos
E a treva fez-se luz
A luz cheia de átomos de vida
A luz – a grande luz que sobe sempre
.

Anunciação ... mais Cecília

Toca essa música de seda, frouxa e trêmula,
que apenas embala a noite e balança as estrelas noutro mar.
Do fundo da escuridão nascem vagos navios de ouro,
com as mãos de esquecidos corpos quase desmanchados no vento.
E o vento bate nas cordas, e estremecem as velas opacas,
e a água derrete um brilho fino, que em si mesmo logo se perde.
Toca essa música de seda, entre areias e nuvens e espumas.
Os remos pararão no meio da onda, entre os peixes suspensos:
e as cordas partidas andarão pelos ares dançando à-toa.
Cessará esta música de sombra, que apenas indica valores de ar.
Não haverá mais nossa vida, talvez não haja nem o pó que fomos.
E a memória de tudo desmanchará suas dunas desertas,
e em navios novos homens eternos navegarão.

Motivo - Cecília Meireles

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Si desmorono ou si edifico,
si permaneço ou me desfaço,
-- não sei, não sei. Não sei si fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
-- mais nada.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Maria Bethania Pedrinha Miudinha Orixá História pro Sinhozinho-Cirandas

Adriana Calcanhotto - Devolva-me - Vídeo Oficial

Ana Carolina - Força Estranha

Uma carta de amor

"Querida Catherine,
Sinto por ter demorado a escrever. É como se eu estivesse perdido... sem rumo, sem bússola. Vivo colidindo com as coisas, um pouco maluco, acho. Nunca estive perdido antes, você era meu norte. Sempre soube o caminho de casa, quando você era minha casa. Perdoe-me por ter ficado tão nervoso quando você partiu. Eu ainda acho que cometemos alguns erros... e espero que Deus os repare. Mas estou melhor, o trabalho me ajuda. Acima de tudo, você me ajuda.
Você me apareceu em sonho ontem, com aquele sorriso... que me prendia como um amante... embalava como uma criança.
Tudo que lembro do sonho é uma sensação de paz. Acordei com uma sensação... e tentei mantê-la enquanto foi possível. Estou escrevendo para dizer que estou viajando rumo a essa paz... e para dizer que sinto por muitas coisas. Sinto por não ter cuidado melhor de você... para que nunca tivesse um minuto de frio, medo ou doença... sinto por não ter buscado com afinco as palavras... para expressar o que eu sentia. Sinto por não ter consertado a porta de tela. Consertei agora. Sinto por ter brigado com você. Por não ter pedido mais desculpas. Eu era muito orgulhoso. Sinto por não feito mais elogios... tudo que vestia e ao modo como arrumava o cabelo.
Sinto por não tê-la abraçado com tanta força... que nem Deus poderia tira-la. Com todo amor, Grechtt."

Será possível amar assim?

S

“Sem você em meus braços, eu sinto a alma vazia. Surpreendo a mim mesmo examinando os rostos numa multidão, à procura do seu. Sei que é impossível, mas não posso evitar. Certa vez, nós conversamos sobre o que aconteceria se um dia as circunstâncias nos separassem, mas eu não posso manter a promessa que fiz a você naquela noite. Sinto muito, querida, mas nunca vai haver outra pessoa em seu lugar. Você, e só você, foi sempre a única que eu quis, e agora que você se foi, não quero encontrar mais ninguém. “ Até que a morte nos separe” foram as palavras que murmuramos na igreja, e hoje eu acredito que essas palavras continuarão verdadeiras até o dia em que eu também for levado desse mundo." Garret

domingo, 6 de novembro de 2011

Anarquismo, literalmente: "sem poder"


Movimento político que defende uma organização social baseada em consensos e na cooperação de indivíduos livres e autónomos, mas onde à partida sejam abolidas entre eles todas as formas de poder. A Anarquia seria assim uma sociedade sem poder, dado que os indivíduos de uma dada sociedade, se auto-organizariam de tal forma que garantiriam que todos teriam em todas as circunstâncias a mesma capacidade de decisão. Esta sociedade, objecto de inúmeras configurações, apresenta-se como uma "Utopia" (algo sem tempo ou espaço determinado). É um ideal a atingir.
 As origens do anarquismo, entroncam directamente na concepção individualista dos direitos naturais defendida por John Locke. A sociedade para este filósofo inglês era o resultado de um contrato voluntário acordado entre individuos iguais em direito e em deveres. No entanto foi só  a partir do final do século XVIII que o anarquismo se veio a estruturar como uma corrente política autónoma, com seguidores em toda a parte do mundo. Entre os seus teóricos contam-se pensadores tão diversos como William Godwin (1773-1836), P.J.Proudhon (1809-1865),  Bakunine (1814-1870), Kropotkin (1842-1921) ou o português Silva Mendes. 
A intervenção política dos anarquistas, pouco inclinados à constituição de grandes organizações, embora muito dispersa tem historicamente se centrado a sua luta na defesa de seis ideias:

1. Direitos Fundamentais dos Indivíduos.
Os anarquistas, como os liberais foram os primeiros retirar das ideias de John Locke profundas implicações politicas. Em primeiro lugar a ideia da primazia do indivíduo face à sociedade. Em segundo, a ideia de que todo o indivíduo é único e possui um conjunto de direitos naturais que não podem ser posto em causa por nenhum tipo de sociedade que exista ou venha a ser criada.

2. Acção Directa.
Recusando por princípio o sistema de representação, os anarquistas afirmam o valor da acção directa do indivíduo na realidade social. Este conceito foi interpretado no final do século XIX/princípios do século XX, por alguns anarquistas, como uma forma de actuação política, cometendo assassinatos de figuras políticas que diziam simbolizarem tudo aquilo que reprovavam ( a célebre propaganda por factos).  

3. Crítica dos Preconceitos Ideológicos e Morais.
Uma das suas facetas mais conhecidas pela sua crítica irreverente à sociedade. Com a sua crítica demolidora dos preconceitos sociais pretendem destruir todas as condicionantes mentais que possam impedir o indivíduo de ser livre e de se assumir como tal. 

4. Educação Libertária.
Os anarquistas viram na educação um processo de emancipação dos indivíduos, acreditando que por esta via podiam lançar as bases de um nova sociedade.  

5. Auto-organização.
Embora recusem qualquer forma de poder, a maioria dos anarquistas não recusa a constituição de organizações. Estas devem contudo ser o resultado de uma acção consciente e voluntária dos seus membros, mantendo entre eles uma total igualdade de forma a impedir a formação de relações de poder (dirigentes/dirigidos, representantes/representados, etc). É por esta razão que tendem desconfiar ou combater, as grandes organizações porque nelas a maioria dos indivíduos tendem a ser afastados dos processos de decisão. Os anarquistas estão desde o século XIX ligados à criação de sociedades mutualistas, cooperativas, associações de trabalhadores (sindicatos e confederações, etc), ateneus, colónias e experiências auto-gestionárias. Em todas estas formas de organização procuram em pequena ou grande escala ensaiar a sociedade que preconizam.    

6. Sociedade Global.
Um dos seus grandes ideais foi sempre a constituição de uma sociedade planetária que permitisse a livre circulação de pessoas ou o fim das guerras entre países. É neste sentido que alguns anarquistas, como P. Kropotkin, viram no desenvolvimento das tecnologias de comunicação e informação um meio que poderia conduzir ao advento da Anarquia. 
A defesa destas ideias tem caracterizado o movimento anarquista internacional, ao longo dos seus duzentos anos de existência. 

A Cruz de Giz - Brecht

Eu sou uma criada. Eu tive um romance
Com um homem que era da SA.
Um dia, antes de ir
Ele me mostrou, sorrindo, como fazem
Para pegar os insatisfeitos.
Com um giz tirado do bolso do casaco
Ele fez uma pequena cruz na palma da mão.
Ele contou que assim, e vestido à paisana
anda pelas repartições do trabalho
Onde os empregados fazem fila e xingam
E xinga junto com eles, e fazendo isso
Em sinal de aprovação e solidariedade
Dá um tapinha nas costas do homem que xinga
E este, marcado com a cruz branca
ë apanhado pela SA. Nós rimos com isso.
Andei com ele um ano, então descobri
Que ele havia retirado dinheiro
Da minha caderneta de poupança.
Havia dito que a guardaria para mim
Pois os tempos eram incertos.
Quando lhe tomei satisfações, ele jurou
Que suas intenções eram honestas. Dizendo isso
Pôs a mão em meu ombro para me acalmar.
Eu corri, aterrorizada. Em casa
Olhei minhas costas no espelho, para ver
Se não havia uma cruz branca.

... mais cansado que sozinho!

... um dia vai ficar como devia estar!

Carta da Terra

PREÂMBULO
Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro reserva, ao mesmo tempo, grande perigo e grande esperança. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio de uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos nos juntar para gerar uma sociedade sustentável global fundada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade de vida e com as futuras gerações.
TERRA, NOSSO LAR
A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, é viva como uma comunidade de vida incomparável. As forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de recuperação da comunidade de vida e o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação comum de todos os povos. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da Terra é um dever sagrado.
A SITUAÇÃO GLOBAL
Os padrões dominantes de produção e consumo estão causando devastação ambiental, esgotamento dos recursos e uma massiva extinção de espécies. Comunidades estão sendo arruinadas. Os benefícios do desenvolvimento não estão sendo divididos eqüitativamente e a diferença entre ricos e pobres está aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância e os conflitos violentos têm aumentado e são causas de grande sofrimento. O crescimento sem precedentes da população humana tem sobrecarregado os sistemas ecológico e social. As bases da segurança global estão ameaçadas. Essas tendências são perigosas, mas não inevitáveis.
DESAFIOS FUTUROS
A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida. São necessárias mudanças fundamentais em nossos valores, instituições e modos de vida. Devemos entender que, quando as necessidades básicas forem supridas, o desenvolvimento humano será primariamente voltado a ser mais e não a ter mais. Temos o conhecimento e a tecnologia necessários para abastecer a todos e reduzir nossos impactos no meio ambiente. O surgimento de uma sociedade civil global está criando novas oportunidades para construir um mundo democrático e humano. Nossos desafios ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados e juntos podemos forjar soluções inclusivas.
RESPONSABILIDADE UNIVERSAL
Para realizar estas aspirações, devemos decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificando-nos com a comunidade terrestre como um todo, bem como com nossas comunidades locais. Somos, ao mesmo tempo, cidadãos de nações diferentes e de um mundo no qual as dimensões local e global estão ligadas. Cada um compartilha responsabilidade pelo presente e pelo futuro bem-estar da família humana e de todo o mundo dos seres vivos. O espírito de solidariedade humana e de parentesco com toda a vida é fortalecido quando vivemos com reverência o mistério da existência, com gratidão pelo dom da vida e com humildade em relação ao lugar que o ser humano ocupa na natureza.
Necessitamos com urgência de uma visão compartilhada de valores básicos para proporcionar um fundamento ético à comunidade mundial emergente. Portanto, juntos na esperança, afirmamos os seguintes princípios, interdependentes, visando a um modo de vida sustentável como padrão comum, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações, empresas, governos e instituições transnacionais será dirigida e avaliada.

PRINCÍPIOS
I. RESPEITAR E CUIDAR DA COMUNIDADE DE VIDA

1. Respeitar a Terra e a vida em toda sua diversidade.
  1. Reconhecer que todos os seres são interdependentes e cada forma de vida tem valor, independentemente de sua utilidade para os seres humanos.
  2. Afirmar a fé na dignidade inerente de todos os seres humanos e no potencial intelectual, artístico, ético e espiritual da humanidade.
2. Cuidar da comunidade da vida com compreensão, compaixão e amor.
  1. Aceitar que, com o direito de possuir, administrar e usar os recursos naturais, vem o dever de prevenir os danos ao meio ambiente e de proteger os direitos das pessoas.
  2. Assumir que, com o aumento da liberdade, dos conhecimentos e do poder, vem a
    maior responsabilidade de promover o bem comum.
3. Construir sociedades democráticas que sejam justas, participativas, sustentáveis e pacíficas.
  1. Assegurar que as comunidades em todos os níveis garantam os direitos humanos e as liberdades fundamentais e proporcionem a cada pessoa a oportunidade de realizar seu pleno potencial.
  2. Promover a justiça econômica e social, propiciando a todos a obtenção de uma condição de vida significativa e segura, que seja ecologicamente responsável.
4. Assegurar a generosidade e a beleza da Terra para as atuais e às futuras gerações.
  1. Reconhecer que a liberdade de ação de cada geração é condicionada pelas necessidades das gerações futuras.
  2. Transmitir às futuras gerações valores, tradições e instituições que apóiem a prosperidade das comunidades humanas e ecológicas da Terra a longo prazo.
II. INTEGRIDADE ECOLÓGICA

5. Proteger e restaurar a integridade dos sistemas ecológicos da Terra, com especial atenção à diversidade biológica e aos processos naturais que sustentam a vida.
  1. Adotar, em todos os níveis, planos e regulamentações de desenvolvimento sustentável que façam com que a conservação e a reabilitação ambiental sejam parte integral de todas as iniciativas de desenvolvimento.
  2. stabelecer e proteger reservas naturais e da biosfera viáveis, incluindo terras selvagens e áreas marinhas, para proteger os sistemas de sustento à vida da Terra, manter a biodiversidade e preservar nossa herança natural.
  3. Promover a recuperação de espécies e ecossistemas ameaçados.
  4. Controlar e erradicar organismos não-nativos ou modificados geneticamente que
    causem dano às espécies nativas e ao meio ambiente e impedir a introdução desses
    organismos prejudiciais.
  5. Administrar o uso de recursos renováveis como água, solo, produtos florestais e vida marinha de forma que não excedam às taxas de regeneração e que protejam a saúde dos ecossistemas.
  6. Administrar a extração e o uso de recursos não-renováveis, como minerais e combustíveis fósseis de forma que minimizem o esgotamento e não causem dano ambiental grave.
6. Prevenir o dano ao ambiente como o melhor método de proteção ambiental e, quando o conhecimento for limitado, assumir uma postura de precaução.
  1. Agir para evitar a possibilidade de danos ambientais sérios ou irreversíveis, mesmo quando o conhecimento científico for incompleto ou não-conclusivo.
  2. Impor o ônus da prova naqueles que afirmarem que a atividade proposta não causará dano significativo e fazer com que as partes interessadas sejam responsabilizadas pelo dano ambiental.
  3. Assegurar que as tomadas de decisão considerem as conseqüências cumulativas, a longo prazo, indiretas, de longo alcance e globais das atividades humanas.
  4. Impedir a poluição de qualquer parte do meio ambiente e não permitir o aumento de substâncias radioativas, tóxicas ou outras substâncias perigosas.
  5. Evitar atividades militares que causem dano ao meio ambiente.
7. Adotar padrões de produção, consumo e reprodução que protejam as capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem-estar comunitário.
  1. Reduzir, reutilizar e reciclar materiais usados nos sistemas de produção e consumo e garantir que os resíduos possam ser assimilados pelos sistemas ecológicos.
  2. Atuar com moderação e eficiência no uso de energia e contar cada vez mais com fontes energéticas renováveis, como a energia solar e do vento.
  3. Promover o desenvolvimento, a adoção e a transferência eqüitativa de tecnologias
    ambientais seguras.
  4. Incluir totalmente os custos ambientais e sociais de bens e serviços no preço de venda e habilitar os consumidores a identificar produtos que satisfaçam às mais altas normas sociais e ambientais.
  5. Garantir acesso universal à assistência de saúde que fomente a saúde reprodutiva e a reprodução responsável.
  6. Adotar estilos de vida que acentuem a qualidade de vida e subsistência material num mundo finito.
8. Avançar o estudo da sustentabilidade ecológica e promover o intercâmbio aberto e aplicação ampla do conhecimento adquirido.
  1. Apoiar a cooperação científica e técnica internacional relacionada à sustentabilidade, com especial atenção às necessidades das nações em desenvolvimento.
  2. Reconhecer e preservar os conhecimentos tradicionais e a sabedoria espiritual em todas as culturas que contribuem para a proteção ambiental e o bem-estar humano.
  3. Garantir que informações de vital importância para a saúde humana e para a proteção ambiental, incluindo informação genética, permaneçam disponíveis ao domínio público.
III. JUSTIÇA SOCIAL E ECONÔMICA

9. Erradicar a pobreza como um imperativo ético, social e ambiental.
  1. Garantir o direito à água potável, ao ar puro, à segurança alimentar, aos solos não contaminados, ao abrigo e saneamento seguro, alocando os recursos nacionais e internacionais demandados.
  2. Prover cada ser humano de educação e recursos para assegurar uma condição de vida sustentável e proporcionar seguro social e segurança coletiva aos que não são capazes de se manter por conta própria.
  3. Reconhecer os ignorados, proteger os vulneráveis, servir àqueles que sofrem e habilitá-los a desenvolverem suas capacidades e alcançarem suas aspirações.
10. Garantir que as atividades e instituições econômicas em todos os níveis promovam o desenvolvimento humano de forma eqüitativa e sustentável.
  1. Promover a distribuição eqüitativa da riqueza dentro das e entre as nações.
  2. Incrementar os recursos intelectuais, financeiros, técnicos e sociais das nações em desenvolvimento e liberá-las de dívidas internacionais onerosas.
  3. Assegurar que todas as transações comerciais apóiem o uso de recursos sustentáveis, a proteção ambiental e normas trabalhistas progressistas.
  4. Exigir que corporações multinacionais e organizações financeiras internacionais
    atuem com transparência em benefício do bem comum e responsabilizá-las pelas
    conseqüências de suas atividades.
11. Afirmar a igualdade e a eqüidade dos gêneros como pré-requisitos para o desenvolvimento sustentável e assegurar o acesso universal à educação, assistência de saúde e às oportunidades econômicas.
  1. Assegurar os direitos humanos das mulheres e das meninas e acabar com toda violência contra elas.
  2. Promover a participação ativa das mulheres em todos os aspectos da vida econômica, política, civil, social e cultural como parceiras plenas e paritárias, tomadoras de decisão, líderes e beneficiárias.
  3. Fortalecer as famílias e garantir a segurança e o carinho de todos os membros da
    família.
12. Defender, sem discriminação, os direitos de todas as pessoas a um ambiente natural e social capaz de assegurar a dignidade humana, a saúde corporal e o bem-estar espiritual, com especial atenção aos direitos dos povos indígenas e minorias.
  1. Eliminar a discriminação em todas as suas formas, como as baseadas em raça, cor, gênero, orientação sexual, religião, idioma e origem nacional, étnica ou social.
  2. Afirmar o direito dos povos indígenas à sua espiritualidade, conhecimentos, terras e recursos, assim como às suas práticas relacionadas com condições de vida sustentáveis.
  3. Honrar e apoiar os jovens das nossas comunidades, habilitando-os a cumprir seu
    papel essencial na criação de sociedades sustentáveis.
  4. Proteger e restaurar lugares notáveis pelo significado cultural e espiritual.
IV. DEMOCRACIA, NÃO-VIOLÊNCIA E PAZ

13. Fortalecer as instituições democráticas em todos os níveis e prover transparência e responsabilização no exercício do governo, participação inclusiva na tomada de decisões e acesso à justiça.
  1. Defender o direito de todas as pessoas receberem informação clara e oportuna sobre assuntos ambientais e todos os planos de desenvolvimento e atividades que possam afetá-las ou nos quais tenham interesse.
  2. Apoiar sociedades civis locais, regionais e globais e promover a participação significativa de todos os indivíduos e organizações interessados na tomada de decisões.
  3. Proteger os direitos à liberdade de opinião, de expressão, de reunião pacífica, de associação e de oposição.
  4. Instituir o acesso efetivo e eficiente a procedimentos judiciais administrativos e independentes, incluindo retificação e compensação por danos ambientais e pela ameaça de tais danos.
  5. Eliminar a corrupção em todas as instituições públicas e privadas.
  6. Fortalecer as comunidades locais, habilitando-as a cuidar dos seus próprios ambientes, e atribuir responsabilidades ambientais aos níveis governamentais onde possam ser cumpridas mais efetivamente.
14. Integrar, na educação formal e na aprendizagem ao longo da vida, os conhecimentos, valores e habilidades necessárias para um modo de vida sustentável.
  1. Prover a todos, especialmente a crianças e jovens, oportunidades educativas que lhes permitam contribuir ativamente para o desenvolvimento sustentável.
  2. Promover a contribuição das artes e humanidades, assim como das ciências, na educação para sustentabilidade.
  3. Intensificar o papel dos meios de comunicação de massa no aumento da conscientização sobre os desafios ecológicos e sociais.
  4. Reconhecer a importância da educação moral e espiritual para uma condição de vida sustentável.
15. Tratar todos os seres vivos com respeito e consideração.
  1. Impedir crueldades aos animais mantidos em sociedades humanas e protegê-los de sofrimento.
  2. Proteger animais selvagens de métodos de caça, armadilhas e pesca que causem sofrimento extremo, prolongado ou evitável.
  3. Evitar ou eliminar ao máximo possível a captura ou destruição de espécies não visadas.
16. Promover uma cultura de tolerância, não-violência e paz.
  1. Estimular e apoiar o entendimento mútuo, a solidariedade e a cooperação entre todas as pessoas, dentro das e entre as nações.
  2. Implementar estratégias amplas para prevenir conflitos violentos e usar a colaboração na resolução de problemas para administrar e resolver conflitos ambientais e outras disputas.
  3. Desmilitarizar os sistemas de segurança nacional até o nível de uma postura defensiva não-provocativa e converter os recursos militares para propósitos pacíficos, incluindo restauração ecológica.
  4. Eliminar armas nucleares, biológicas e tóxicas e outras armas de destruição em
    massa.
  5. Assegurar que o uso do espaço orbital e cósmico ajude a proteção ambiental e a paz.
  6. Reconhecer que a paz é a plenitude criada por relações corretas consigo mesmo, com outras pessoas, outras culturas, outras vidas, com a Terra e com a totalidade maior da qual somos parte.
O CAMINHO ADIANTE
Como nunca antes na História, o destino comum nos conclama a buscar um novo começo. Tal renovação é a promessa destes princípios da Carta da Terra. Para cumprir esta promessa, temos que nos comprometer a adotar e promover os valores e objetivos da Carta.
Isto requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal. Devemos desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida sustentável nos níveis local, nacional, regional e global. Nossa diversidade cultural é uma herança preciosa e diferentes culturas encontrarão suas próprias e distintas formas de realizar esta visão. Devemos aprofundar e expandir o diálogo global que gerou a Carta da Terra, porque temos muito que aprender a partir da busca conjunta em andamento por verdade e sabedoria.
A vida muitas vezes envolve tensões entre valores importantes. Isto pode significar escolhas difíceis. Entretanto, necessitamos encontrar caminhos para harmonizar a diversidade com a unidade, o exercício da liberdade com o bem comum, objetivos de curto prazo com metas de longo prazo. Todo indivíduo, família, organização e comunidade tem um papel vital a desempenhar. As artes, as ciências, as religiões, as instituições educativas, os meios de comunicação, as empresas, as organizações não-governamentais e os governos são todos chamados a oferecer uma liderança criativa. A parceria entre governo, sociedade civil e empresas é essencial para uma governabilidade efetiva.
Para construir uma comunidade global sustentável, as nações do mundo devem renovar seu compromisso com as Nações Unidas, cumprir com suas obrigações respeitando os acordos internacionais existentes e apoiar a implementação dos princípios da Carta da Terra com um instrumento internacionalmente legalizado e contratual sobre o ambiente e o desenvolvimento.
Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação dos esforços pela justiça e pela paz e a alegre celebração da vida.